quarta-feira, 11 de maio de 2011

11º de Maio – O sofrimento em Jó

“Depois disto, passou Jó a falar e amaldiçoou o seu dia natalício”. Jo 3:1

Durante essa semana acompanhamos nos noticiários da televisão, especialmente pela Globo, sobre a denúncia do ministério público sobre alguns líderes religiosos, dentre eles Edir Macedo fundador da Igreja Universal do Reino de Deus. São acusações de lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e compra de bens pessoais como, por exemplo, a de uma emissora de televisão, Record, através das contribuições arrecadadas na igreja. Por outro lado, os jornais da Record negam as acusações contra Edir Macedo e a Igreja Universal, mas afirmam que é uma prática da igreja o pedido de grandes quantias de dinheiro para os fiéis bem como o anúncio da prosperidade material. Sabe-se que por trás das acusações existe uma guerra particular entre Globo e Record pela audiência do seus telespectadores. Em muitos momentos vemos os ataques dos dois lados através de denúncias sobre práticas ilícitas feitas pelas emissoras.

Em meio a essas trocas de agressões, encontram-se os evangélicos e as igrejas que recebem julgamento generalizado daqueles que não compreendem que cada denominação tem a sua maneira de expressar a fé. Também preocupa a existência, no meio evangélico, de uma corrente teológica chamada Teologia da Prosperidade, pregada pelas igrejas neopentecostais, que anuncia que a vida do cristão deve ser livre de qualquer problema. Ele deve morar em mansões, possuir carros caros, ter muito dinheiro e muita saúde. Mas tudo isso tem um preço, na qual o cristão deve estar disposto a pagar. Se isso não ocorrer, estará caracterizada a ausência de fé, a vida em pecado ou então o domínio de Satanás.

Aqueles que anunciam a teologia da prosperidade afirmam que a doença não tem relação com problemas hereditários, condições do meio ambiente ou do contexto social em que vive o doente. As enfermidades são provocadas por ações espirituais. Se você estiver com dengue é uma questão espiritual, é falta de fé.

Vivemos numa sociedade individualista que fomenta a concorrência e competição em que vencem os mais fortes, os mais preparados e competentes. Uma sociedade que visa resultados e lucro. João B. Libâneo afirma que diante dessa realidade capitalista, “é necessário encontrar uma religião que reforce a vitória e a prosperidade dos melhores. Recorre-se então à teologia da bênção de Deus para os ricos e ao castigo para os pobres, porque são preguiçosos e pecadores. É uma idéia sobre Deus feita sob medida para alimentar igrejas que sustentam esse sistema. Elas concebem a vida religiosa como uma transação financeira com o céu. Recorre a ela para pedir e exigir que os fiéis façam ofertas sempre maiores. Assim, receberão de Deus ainda mais bênçãos e riquezas, vida longa e próspera.”

Dessa forma, as igrejas que tem pregado tal mensagem consideram que a pobreza material é maldição, castigo de Deus, falta de fé. R. R. Soares, no seu livro “O direito de desfrutar saúde” afirma que o cristão tem que exigir de Deus os seus direitos. Segundo ele, “usar a frase ‘seja feito a sua vontade’ em oração pode parecer espiritual, ou demonstrar atitude piedosa de quem é submisso à vontade do Senhor, mas além de não adiantar nada, destrói a própria oração.” Soma-se a isso o Diabo que tem seu lugar garantido no culto, na qual a “pessoa possuída” é submetida a uma verdadeira exposição diante da igreja, como que se a sua dor e sofrimento não fossem o bastante. É preciso exibir todo um teatro colocando a pessoa numa situação de humilhação.

Fico assustado com alguns programas na televisão, pois percebo que a mensagem neopentecostal torna-se cada vez mais agressiva, os apelos por dinheiro são cada vez mais requintados e ousados. Assusta o fato de que essa linha de pensamento está fazendo escola, muitas igrejas estão percorrendo o mesmo caminho, inclusive as novas que estão surgindo, empregando as mesmas práticas.

Não quero, nessa noite, fazer o papel de juiz sobre quem tem a razão (Globo ou Record). Não estou aqui fazendo acusações, nem mesmo inventando ou falando mentira. Tudo isso que estou dizendo é verdade, está registrado nos programas de televisão, nos livros escritos por líderes religiosos de igrejas neopentecostais.

Minha preocupação é que o último lugar do mundo em que as pessoas esperam se decepcionar é num ambiente de igreja. Paulo Romeiro diz que a igreja, “tida como o espaço terapêutico da alma por excelência, representa para muitos a última esperança de felicidade ou de restauração.” Por isso mesmo há um “choque causado pela frustração de quem um dia acreditou em promessas de prosperidade material ou de curas sobrenaturais que jamais se transformaram em realidade.” Da mesma forma que cresce o número de igrejas neopentecostais, cresce também o número de desiludidos. Esses não aparecem na televisão, são silenciados e ainda taxados como pessoas sem fé.

Reconheço que a nossa igreja também tem falhas, não somos perfeitos. Mas, aqui não enganamos ninguém. Não há espaço para iludir as pessoas, fazer promessas mentirosas e distorcer a verdade bíblica. Ai de mim, subir nesse altar e falar sem a orientação do Espírito Santo, pregar sem o conhecimento bíblico.

O texto de Jó nos ajuda a entender que não há como fazer barganha com Deus e que a nossa relação com Ele não acontece através de compensações. Através de Jó, podemos compreender que o sofrimento é parte da vida humana, alcançando a todos de várias maneiras. O livro de Jó surge na tentativa de quebrar um moralismo existente no meio do povo que acreditava que o sofrimento humano era uma conseqüência do pecado pessoal num período em que Israel estava voltando do exílio babilônico. O autor do livro pinta um personagem perfeito: “homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desviava do mal” (1.1). Um pai de família, possuidor de muitos bens e que um dia passou por calamidades que arrasou a felicidade e a estabilidade de Jó. Até a saúde foi embora, ficando apenas a dor e o sofrimento. A própria esposa não compreendia a situação. Por que?

Três amigos vieram de longe para saber se realmente era verdade o que Jó estava vivendo e viram a triste situação em que se encontrava. Para aqueles amigos, a catástrofe de Jó só tinha um motivo, o pecado. Elifaz repreende Jó, Zofar acusa Jó pelas iniqüidades, Bildade também vai atacar Jó, insistindo para que confessasse seu pecado. Já, a partir do capítulo 32, aparece um outro amigo, Eliú que entra na discussão na certeza de que Jó era realmente culpado (34.36-37).

Ao ouvi-los insinuar e depois direta e claramente afirmar que o seu sofrimento era o inevitável fruto da semente do pecado que ele cometera e que só Deus era testemunha, Jó se defende, suas palavras mostram que ele sabia qual era a sua realidade. Ele reconhecia sua dor e mostra que o motivo do seu sofrimento não podia ser seu pecado (6.26-29). Jó não só nega as acusações de seus amigos como também questiona a Deus sobre as tribulações que estava atravessando (9.17; 10.2). Era um homem angustiado que tenta encontrar respostas. Sentia-se injustiçado (10.7).

Meus queridos, independente de ser judeu, cristão, ou ateu, qualquer um conhece o significado da dor. O sofrimento acompanha o ser humano de todas as épocas e atinge o mundo todo, ainda que em proporções desiguais. Existem situações na qual não encontraremos respostas, outras que vão permanecer conosco o resto da vida não no sentido de nos diminuir, mas para nos edificar. Os cristãos sofrem não apenas porque estão num mundo afetado pelo mal, mas pela sua identificação com Cristo. Cruz é sinal de dor e Jesus não nos mandou abandonar nossa cruz, mas carregá-la. Porém, as coisas não param por ai, há uma esperança que sustenta a nossa vida no meio da dor. Dor e esperança caminham juntas em direção ao futuro, ao cumprimento das promessas de Deus. Essa esperança encontra-se na ressurreição de Cristo.

Paulo em 2Coríntios 12.9-10 pediu a Deus que removesse um espinho que estava na sua carne, algum sofrimento, talvez físico, e recebeu a seguinte resposta a sua oração: “Então, ele me disse: a minha graça te basta; porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, mais me glorificarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo. Pelo que sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias, por amor de Cristo. Porque, quando sou fraco, então, é que sou forte”.

Foi em meio a uma situação limite que Jó faz uma declaração de fé e esperança: “porque eu sei que o meu Redentor vive e por fim se levantará sobre a terra” (19.25). Diante de seu sofrimento e angústia, mesmo sem entender e sem resposta a sua aflição, Jó mantinha acessa a esperança dentro do seu coração. Suportou a dor da perda dos filhos, da perda da saúde e as acusações dos amigos porque tinha a certeza de que não estava sozinho. Ainda que o silêncio de Deus o incomodasse, Jó foi paciente, fazendo das suas lamentações o veículo para derramar a sua dor.

Quando menos esperava, Deus apareceu a Jó no meio de um redemoinho, mostrando que por mais que o ser humano tente, não compreenderá os designos de Deus. Por mais que o aparecimento dos amigos trouxesse controvérsia, desilusão e desespero, a revelação de Deus promoveu na vida de Jó submissão, fé e coragem. As palavras dos amigos trouxeram escuridão, mas a palavra de Deus trouxe luz. Assim, Jó reconhece que Deus é muito maior do que suas dores. Se antes o conhecia apenas de ter ouvido, apenas pelas histórias que aprendeu, no meio da sua tribulação Jó encontrou com Deus. No meio da agonia, seus olhos enxergaram a presença do Senhor ao seu lado (42.1-6). 

É interessante que Jó não precisou ofertar nada, muito menos determinou que Deus tinha que atender suas orações. Sua experiência com Deus se deu na dor, foi ali que Jó entendeu que o Senhor era solidário ao seu sofrimento. É verdade que no final do livro Deus restitui sua família e sua vida, mas não fez isso por compensação, mas por graça. Essa é a mensagem do livro, mostrar que o sofrimento não é fruto de pecado, mas um processo humano e que em meio as tribulações podemos olhar com esperança para Deus. A fé e a esperança deram a Jó o respaldo necessário no período da provação: “embora ele me mate, ainda assim esperarei nele (13.15).

Ao contrário do que se prega pelos seguidores da teologia da prosperidade, o cristão não é um “supercrente”. Ele está propenso ao sofrimento, as frustrações, doenças, crises financeiras, desemprego. Isso não acontece por causa do seu pecado, mas porque é humano. E é justamente nesses momentos que os nossos olhos encontram Deus ao nosso lado, solidário a nossa dor, para nos encorajar e nos encher de fé e esperança. Deus não se revelou em Jesus Cristo para tirar nossas dores, mas para compartilhá-las. O fato da pessoa sofrer não significa que Deus a abandonou. Jó é um exemplo nítido de alguém que teve uma vida íntegra envolvida pelas adversidades. Jó sofreu, mas ele mesmo nunca o soube, o que realça mais ainda seu testemunho de fé em Deus.

Philip Yancey diz que “graça significa que não há nada que possamos fazer para Deus nos amar mais [...] não a nada que possamos fazer a menos para Deus nos amar menos”. Isso significa que não dá pra fazer barganha com Deus. Não é seu dinheiro que vai fazê-lo te amar ou te abençoar mais. Ele te ama e isso é graça.

Que sejamos sábios, maduros em nossa fé, meditando sempre na Palavra do Senhor que é alimento para as nossas vidas. Assim, não seremos enganados pelos falsos profetas que querem apenas buscar benefício próprio, ainda que isso custe oprimir e iludir o povo de Deus com falsas promessas. Que Deus tenha misericórdia e que possa haver profundo arrependimento daqueles que usam a Bíblia para manipular as pessoas.

GUIA DEVOCIONAL - 2011 COM DEUS


“Fides quaerens intellectum.”
(Porque creio, busco entender!)


Pr. Carlos Henrique
Igreja Metodista de Timóteo

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